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  Na mesma linha - Merval Pereira

Data: 21/09/2016

 

Na mesma linha - Merval Pereira

 
- O Globo
 
Tom épico do MP não fragilizou fatos. O teor do despacho do juiz Sérgio Moro aceitando a denúncia contra o ex-presidente Lula, sua mulher, dona Marisa, e outras seis pessoas ligadas ao Instituto Lula e à empreiteira OAS demonstra que, ao contrário do que muitos criticaram, inclusive eu, o tom quase épico dos procuradores de Curitiba ao anunciar a denúncia não fragilizou diante dele os fatos apresentados.
 
Mesmo tendo deixado claro, como é natural neste momento do processo, que só a instrução da ação penal poderá confirmar que as vantagens ilícitas recebidas por Lula tiveram origem em contratos da OAS com a Petrobras, Moro avalizou os indícios de que essa relação existiu, e justifica o fato de os procuradores terem acusado o ex-presidente de “chefe da quadrilha” pela necessidade mesma de relacionar as obras da OAS, especialmente da Petrobras, e os benefícios que teriam sido recebidos por Lula.
 
Moro ressalta que “é razoável” considerar essa relação, uma vez que a maior parte do faturamento do grupo OAS decorria de contratos com a Petrobras. Um ponto interessante do despacho do juiz Moro é quando ele rejeita as acusações de que o valor de R$ 3,7 milhões recebido por Lula no tríplex do Guarujá, além do armazenamento de bens pessoais pago pela OAS, seja pequeno em relação aos milhões em propinas recebidos por outros políticos e dirigentes da estatal.
 
“Embora aparentem ser, no presente caso, desproporcionais os valores das vantagens indevidas recebidas pelo ex-presidente com a magnitude do esquema criminoso que vitimou a Petrobras, esse é um argumento que, por si só, não justificaria a rejeição da denúncia, já que isso não descaracterizaria o ilícito, não importando se a propina imputada alcance o montante de milhares, milhões ou de dezenas de milhões de reais”. E deixa no ar uma advertência aos críticos mais afoitos: “Oportuno ainda não olvidar que há outras investigações em curso sobre supostas vantagens recebidas pelo ex-presidente”.
 
De fato, estamos acostumados a nos espantar quando algum político é demitido ou preso em outros países por quantias irrisórias se comparadas aos desvios registrados no Brasil, e esse mesmo espanto serve também para minimizar os desvios atribuídos a Lula.
 
Moro destaca no despacho que Lula recebeu o tríplex da OAS quando ainda na Presidência, e diz que todas as provas e depoimentos colhidos confirmam que o imóvel era dele, embora tenha permanecido em nome da empreiteira. Chama a atenção para o fato de que o casal Lula deixou de efetuar pagamentos justamente quando a OAS assumiu o empreendimento.
 
Os pontos citados pelos procuradores como indícios de que houve manobra para esconder a propriedade do imóvel são destacados por Moro, como rasura dos termos de adesão, que indica que a propriedade do apartamento normal foi transferida para a cobertura após a OAS assumir a obra; as visitas de Lula, Marisa e filhos à cobertura; e os gastos da OAS com reforma e mobiliário, inclusive da cozinha Kitchens, mesmo modelo do sítio de Atibaia, para concluir que o caso do tríplex guarda semelhança com o do sítio: “colocação de propriedades em nome de pessoas interpostas para ocultação de patrimônio”.
 
Em seu despacho, o juiz Sérgio Moro considera uma autoincriminação o fato de Paulo Okamotto ter pedido um habeas corpus preventivo no TRF-4, que foi negado. Okamotto reconhece que “solicitou à OAS que contribuísse com as elevadas despesas de preservação do colossal acervo”, o que, para Moro, significa que “houve um aparente reconhecimento das premissas fáticas estabelecidas pelo MPF”, que relacionou o custeio da armazenagem às propinas acertadas no esquema criminoso da Petrobras.
 
Como indício de que houve uma negociação ilegal, Moro cita que o orçamento da transportadora Granero foi pedido por Okamotto “para armazenagem dos bens pertencentes a Luiz Inácio Lula da Silva, o que foi aceito em 27/12/2010”. Mas o contrato de armazenagem, com valor mensal de R$ 21.536,84, foi celebrado, em 01/01/2011, entre a Construtora OAS e a Granero”.
 
Para Moro, “o real propósito do contrato foi ocultado, pois nele constou que o objeto seria a ‘armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativa de propriedade da Construtora OAS Ltda.’”.



 

 

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