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  EM BUSCA DA COERÊNCIA PERDIDA - Philippe Guédon

Data: 28/06/2020

 

EM BUSCA DA COERÊNCIA PERDIDA

Philippe Guédon *

 

Li e reli, com olhos de leigo, a Constituição Federal e a Lei dos partidos políticos (9.096/95) em busca de coerência entre o poder do povo e o poder dos partidos.

A Carta Magna abre-se por cinco Fundamentos, dentre os quais a cidadania e o pluralismo político (sejam todas as correntes do pensamento político). No parágrafo único do artigo 1º, eis o Princípio Fundamental: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Já nos Direitos e Garantias Fundamentais, encontramos o art. 5º, XX: “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado”, que dá a entender que ninguém pode ser compelido a filiar-se a algum partido para ser candidato a cargo eletivo, ou seja acolhem-se os avulsos. Absolutamente coerente com o pluralismo político, que abre a participação à todas as correntes do pensamento econômico, social, político, filosófico. Como casar estes conceitos com o monopólio eleitoral dos partidos?

No Capítulo IV, Dos Direitos Políticos, cuida-se da “soberania popular”. Eis os partidos políticos citados, no art. 14, §3º, V, quando aparece por fina ironia a filiação partidária como condição de elegibilidade, esvaziando o pluralismo político restrito doravante ao pluripartidarismo das legendas que a cláusula de desempenho não terá asfixiado. O que foi proclamado na abertura da Constituição entra em contradição com os artigos a seguir. No artigo 17, enfim, citam-se diretamente os partidos, definindo ser livre a sua criação, resguardado o pluripartidarismo (não era pluralismo político?) entre outros. De onde hauriram as siglas “seus” poderes, que eram todos do povo?

Na Lei 9.096, dita “dos partidos políticos”, o art. 1º informa que “o partido político destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo”. Mas reparem que no Princípio Fundamental ninguém falou sobre intermediário ou atravessador, eram só o povo e seus representantes. Coerente, pois se o Direito do art. 5º, XX, acolhia os candidatos avulsos!

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na sessão de julgamentos de 27 de maio 2017, que não se aplica aos cargos do sistema majoritário de eleição (prefeito, governador, senador e presidente da República) a regra de perda do mandato em favor do partido, por infidelidade partidária, referente aos cargos do sistema proporcional (vereadores, deputados estaduais, distritais e federais). Mas os representantes não eram do povo e já viraram dos partidos?

Não deveria ser explicitado em algum texto como passaram os mandatos dos vereadores e deputados do povo para os partidos? Pois povo e representantes passam a depender dos partidos. Deixou de valer o Princípio Fundamental? Os mandatários filiados a partidos devem seguir as diretrizes de seus órgãos gestores sob pena de eventual perda de mandato? Mas as do povo, perderam a validade? Perdoem a ousadia, mas onde foi anulado o Princípio Fundamental?

Não sei como lidar com as numerosas contradições. Talvez o senso comum não baste, o que também não deveria acontecer pois a Carta foi escrita “em nome do povo”.

 

 

* Coordenador da Frente Pró Petrópolis - FPP




 

 

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